Anvisa divulgou hoje (29), trecho da reunião em que técnicos apontavam aos russos presença de adenovírus replicante na vacina
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) divulgou nesta quinta-feira (29) um trecho de uma reunião em que aponta a pesquisadores do Instituto Gameleya, na Rússia, a presença de adenovírus replicante na vacina contra covid-19 Sputnik V. O problema foi descrito como principal razão para a negativa da importação do imunizante.
O diretor-presidente da agência, Antonio Barra Torres, afirmou que foram os próprios documentos enviados pelo desenvolvedor russo que revelaram a presença de adenovírus replicante. A Sputnik V utiliza dois adenovírus diferentes para cada dose (Ad26 e Ad5) — vírus causadores de resfriado comum. Os desenvolvedores dizem que eles foram inativados, portanto, seriam incapazes de causar doença nas pessoas vacinadas.
Ambos servem como uma espécie de envelope para carregar material genético do coronavírus. A tecnologia é a mesma da vacina Oxford/AstraZeneca e da CanSino. Uma vez rompida essa cápsula do adenovírus, o organismo vai ser capaz de produzir anticorpos capazes de atuar contra o SARS-CoV-2.
“A Anvisa atuou com os documentos enviados pelo próprio desenvolvedor, onde identificou o próprio desenvolvedor a definição da presença do adenovírus replicante”, afirmou Barra Torres. O gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, apresentou as tabelas que mostram as inconsistências identificadas pelos técnicos.
“A empresa estabelece uma especificação de adenovírus replicante para o produto terminado. Muito se discutiu se o que estávamos falando era um produto intermediário da fabricação, mas os dados que nós analisamos, que foram apresentados pelo Instituo Gamaleya, são dados que mostram que há presença do vírus replicante e há uma aceitação do limite de adenovírus replicante no produto acabado. Essa especificação é definida 300 vezes maior do que o maior limite regulatório que nós encontramos, que é o guia da FDA [agência reguladora dos EUA], que trata especificamente de terapias gênicas, não trata de vacina.”
Ele salientou que o esperado, especialmente em vacinas contra a covid-19, é a “ausência de vírus replicante”. Então, no dia 23 de março, técnicos da Anvisa e pesquisadores do Instituto Gamaleya se reuniram por videoconferência e levantaram esses pontos.
Mendes mostrou o áudio de um trecho da reunião — que é gravada, assim como todas outras. Uma técnica da Anvisa é clara ao perguntar sobre a presença do adenovírus replicante.
“Quando vocês continuaram com esse desenvolvimento, qual foi a avaliação de risco conduzida para realmente avaliar o risco da presença dessas partículas na vacina, porque será administrada em pessoas saudáveis. Então, qual é a justificativa que vocês têm para seguir com esse desenvolvimento de uma vacina que será usada em pessoas saudáveis? Isso é algo que deveria ser considerado na avaliação de risco, e nós queremos ter detalhes sobre isso.”
Por meio de uma tradutora, os pesquisadores da Rússia respondem:
“Os representantes da Gamaleya, eles disseram que para a produção da vacina usaram uma linha de células caracterizada, o que pode ter seus defeitos, e claro que vocês têm razão que talvez possamos ter ido atrás, fazer um passo atrás, e começar usando uma nova substância, mas dizem que esse processo devia ter ocupado muito tempo. Assim, nós optamos por outra, por a mesma substância que usamos no início”, diz a tradutora.
Posteriormente, a Anvisa afirma que “em vários momentos da reunião, os representantes fizeram comentários em russo com pausas que chegaram a 4 minutos. Esses debates não foram traduzidos pelo profissional contratado pelo laboratório russo”.
Os desenvolvedores russos concordaram que a Anvisa enviaria a eles, por escrito, as inconsistências para que fossem respondidas posteriormente. Em 26 de março, a resposta chegou, mas incompleta, segundo Gustavo Mendes.
“As justificativas apontadas não contemplam as questões que nós colocamos como críticas. São questões que envolvem a presença desse adenovírus replicante e de que forma esse adenovírus pode impactar a nossa saúde.”
A Diretoria Colegiada da Anvisa decidiu no mesmo dia, por unanimidade, pela negativa do pedido de importação da vacina, levando em conta, principalmente, o risco desconhecido oferecido pela presença de adenovírus replicante na Sputnik V.
Barra Torres finalizou afirmando que a negativa “é um retrato temporal” e que “pode ser modificado”.
“Não estamos fechando portas, absolutamente nada. Esses dados apresentados podem ser revistos, corrigidos e reapresentados. Mas a decisão do regulador é um retrato do momento. E no momento, naquela segunda-feira passada, não nos foi possível aprovar, o que nos deu grande tristeza.”
Todavia, ele destacou que “os resultados da avaliação da Anvisa quanto à importação da vacina Sputnik V foram enviados para Organização Mundial da Saúde e para outras autoridades regulatórias estrangeiras”.
Fonte: R7