Diogo Cabral
Hoje, 30.10.2014, é o quarto ano do martírio de FLAVIANO PINTO NETO, líder quilombola maranhense morto pelo latifúndio, do quilombo Charco.
Há quatro anos, na véspera das eleições presidenciais do 2o Turno, por volta das 21 horas, FLAVIANO foi atingido por 7 balas de pistola. Tentaram calar um irmão… Mas acenderam a chama da luta de centenas de comunidades quilombolas maranhenses, que, de forma organizada e firme, passaram a lutar de forma autônoma, na batida do tambor, em defesa dos territórios quilombolas livres. Apresento, sinteticamente, o que ocorreu nesses quatro anos, tanto no processo contra a impunidade, quanto na luta pela autonomia do território quilombola do CHARCO.
30.10.2010- FLAVIANO PINTO NETO é executado nas imediações do Quilombo Charco;
31.10.2010- Familiares registram ocorrência e inquérito policial é instaurado pelo delegado Armando Pacheco;
12.11.2010- Inquérito aponta pista do consórcio que matou FLAVIANO. O fazendeiro Manoel de Gentil e o vice- prefeito de Olinda Nova, Tonho de Gentil são suspeitos da morte de Flaviano;
27.11.2010- Anistia Internacional lança AÇÃO URGENTE Instando as autoridades a incluírem Manoel Santana Costa no Programa Nacional de Defensores dos Direitos Humanos, com proteção integral, e a investigarem todas as ameaças contra ele e membros da comunidade, instando as autoridades a investigarem a fundo o assassinato de Flaviano Pinto Neto, levando os responsáveis à Justiça,Instando as autoridades a agilizarem os processos administrativos para a titulação de propriedade das terras onde vivem há mais de duzentos anos, para livrar as famílias do risco de violência e intimidação.
Dezembro de 2010- Manoel Santana (Manoel do Charco) é incluído no Programa Defensores dos Direitos Humanos e passa a ser escoltado 24h por homens da força nacional.
Janeiro de 2011- CPT MA cobra providências do governo federal a fim de titularizar o quilombo CHARCO. Uma grande reunião com a participação do INCRA, Fundação Palmares, DPU, DPE, OAB/MÁ, FETAEMA, SMDH, CCN, Najup/UFMA ocorre na comunidade. Os quilombolas estão ameaçados de morte e por despejo, em razão de reintegração de posse movida pela Família Gomes contra 92 famílias do CHARCO.
Na Justiça Federal, em SÃO LUÍS, é realizada audiência com a participação dos quilombolas e fazendeiros. JUIZ Federal Ricardo Macieira determina que os quilombolas somente poderão usufruir de 75 hectares de terra e estabeleceu prazo de 180 dias para o INCRA concluir o RTID DA COMUNIDADE CHARCO.
O2.02.2011- JOSUÉ SABÓIA, Ex- PM, é preso preventivamente em São Luís, pelo envolvimento na morte de FLAVIANO. As investigações apontam que ele serviu de intermediário entre os fazendeiros e o pistoleiro Irismar Pereira, que já se encontrava preso por outro homicídio.
22.02.2011-Manoel Gentil foi preso preventivamente pela Polícia do Maranhão. Alguns dias antes, havia anunciado no Charco que um já tinha morrido e tinha mais dez pra morrer. Contudo, passa menos de 24 horas preso.
Março de 2011- Manoel de Gentil, Antônio de Gentil, Josué Sabóia e Irismar Pereira são indiciados pela Polícia Civil por terem matado FLAVIANO Pinto Neto. Numa investigação que contou com a participação de 4 delegados, conseguiu-se chegar a teia criminosa dos mandantes, intermediário e executor.
11 de abril de 2011- Grupo especial de promotores oferece denúncia contra Manoel de Gentil, Antônio de Gentil, Josué Sabóia e Irismar Pereira. O processo criminal se inicia.
Junho de 2011- Quilombolas de todo o estado acampam na porta do TJMA para protestar contra a impunidade no campo. A manifestação é liderada pelo Quilombo Charco. O acampamento é batizado de Negro FLAVIANO. Após dias na porta do TJ, o INCRA do Maranhão é ocupado por dezenas de famílias quilombolas. Uma pauta de exigências é entregue ao governo federal, que num primeiro momento, sequer recebe. Após greve de fome das lideranças quilombolas, o governo federal envia equipes para negociação. Passados 12 dias, o INCRA é ocupado por 2 mil quilombolas, que se reúnem com ministros de estado para tratar da pauta quilombola maranhense. Participam da atividade FETAEMA, CPT, OAB, SMDH, CCN, NAJUP, VIAS DE FATO
30.11.2011- Jose Borges, irmão de FLAVIANO Pinto Neto, é admitido como assistente de acusação.
01.12.2011- Realizada audiência de instrução criminal, onde, por mais de 11 horas, foram ouvidas testemunhas de defesa e acusação.
06.04.2012- Quilombolas do Charco ocupam rodovia MA-014 por mais de 10 horas. Na pauta, celeridade no processo de titulação e processo criminal.
Junho de 2012- Incra aprova RTID DA comunidade Charco;
09.09.2012- Quilombolas do Charco retomam o território tradicional. A sede da fazenda é ocupada.
27.09.2012-Incra publica RTID DO CHARCO em diário oficial.
26.10.2012- Numa decisão exdrúxula, juiz Alexandre Moreira Lima remete processo criminal para a justiça federal. O objetivo é único; retardar o andamento do processo. Faltava apenas a sentença de pronúncia para levar os denunciados da morte de FLAVIANO para Júri Popular. Assistência de acusação reage e processo vai parar no TJ-MA. Durante dois anos, processo permanece parado em razão da manobra. Em setembro de 2014, o processo volta a tramitar na comarca de São João Batista.
Fevereiro de 2013- Várias linhas de roça da comunidade foram destruídas em razão de incêndio criminoso realizado por Manoel de Gentil na área de conflito.
24.04.2013- inspeção judicial na comunidade do Charco que seria realizada foi cancelada.
26.06.2013- Nova inspeção judicial na comunidade Charco.
01.10.2013- Comunidade do Charco e outras comunidades ocupam sede do INCRA MA.
20.03.2014- Portaria de reconhecimento do Território Quilombola Charco é publicado em Diário Oficial da União.
23 a 29 de setembro- 35 comunidades quilombolas, incluindo Charco, ocupam ferrovia da VALE S/A. Na pauta, a publicação do decreto que garante a desapropriação do território Charco. Na mesa redonda, ocorrida em 23 de outubro, Secretária Geral da Presidência garante que até o dia 30.11.2014 o decreto presidencial será publicado.
08 a 15 de outubro- Anistia Internacional realiza missão na comunidade Charco. A comunidade fará parte da Maratona de Cartas da AI, uma atividade de caráter global, que será realizada em dezembro de 2014.
Diogo Cabral é advogado da CPT e da Fetaema